segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Doce fardo

Hoje busco algo nominal. Um discurso direto, um zaz-traz, prosa de esquina. Ando tão desgastado, até mesmo meus cantos mais generosos e educados se cansam da minha fala livre. Os projetos desse eu-convicto, milimetricamente vedado em um caixote, não resistiram ao balanço do mar. Nasci para buscar a luz, num tactismo insano, descontrolado, é assim que me completo.

Tenho que parar de me negar a destreza de todos os meus infortúnios, tenho que parar de achar que os meus abismos são maiores que os seus. Escrevo papéis a noite buscando o calor dos ouvidos que esperam sugar belas letras de mim, pela manhã. Esqueço, então, de rasgar o peito e a sinceridade, moeda do amanhã, se perde na rinha de máscaras.

Não posso sustentar esses vícios, tenho me tornado um próprio. Anacrônico. Ora soberbo, sobrancelha arqueada, cólera vã; ora humilde demais, sou pena. Estou naquela vontade de me dobrar ao meio, triturar o tempo e me calar um pouco.

É ele, o discurso. Ele que me abriu tantas portas agora tem arrancado meu fôlego. Aviso então: quero desbotar meus delírios até que o coração perca os maus hábitos, os sobressaltos no escuro, a tietagem no amanhã.

O silêncio vai recompor minhas dores de praxe e assim estarei de volta.
Os clarões do fim me seduzem e o caldeirão de vozes me enlouquece nas mesas que completo. Não há paz que me afague.

Vou embora, me perder num vão de palavras até cair no paradoxo de querer lhe contar como tudo isso continua a doer.

sábado, 8 de novembro de 2008

Excreção

E então me deixo ser levado pela correnteza das horas. Embrulhando-me em minhas mil personalidades e me maravilhando com as mil faces do mundo. É o meu refúgio. É o meu modo de ser, outrora questionado por seu olhar de metralhadora. Estou cansado desse pedestal. Já é mais do que hora de descer. Cansei de receber concretos fortes e ásperos enquanto armo delicadamente minhas palavras. Os ovos já estão todos quebrados. Não há mais galinha que consiga sobreviver a esse naufrágio de palavras. A verbalização destrói os sentimentos.

Não pense que quero esquecer as horas que ganhei infiltrando-me em pensamentos profundos e tentando tirar conclusões sobre os mesmos. Apenas não quero exigir de tais conclusões uma verdade pura e simples. Tudo é muito complexo, tudo cai em uma teia de pensamentos embaralhados e palavras mentirosas soltadas ao vento de ambos os lados. A minha língua, muitas vezes afiada, enferruja-se e se estende como um tapete vermelho para que você passe. Para que você volte para casa sem os arranhões das minhas palavras desajeitadas.

Acredite que tenho amor e admiração guardados no peito. Que compro velas e escancaro minha caixa de correio bem à porta de sua casa. E não me peça perdão, tenho muito mais pedidos de perdão a se fazer. Deixe que eu me perca na minha correnteza errante, talvez um dia eu me encontre. Ou talvez não exista nada para se encontrar. Continue navegando com a coragem de sempre na sua, que muitas vezes elas ainda se cruzarão. É a nossa sina.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Apelo

Eu, sorrisos femininos, hipocrisia-medo, ombros pequenos e cansados.
Mente insincera, dizem os outros. Fato de espelho.
A terceira prosa do meu espírito se explode em pedaços de fatos incabíveis, eu sou eu em mil facetas, e às vezes tudo o que lhe digo é mentira, acredite.

Você que é linda no seu choro de chuva, embriagada esquece de cobrir as pernas, a pele branca entorpece meus dedos que há tempos só sabem (d)escrevê-la.
Desfarce seus sorrisos de jogos dúbios, respeite as atrocidades do tempo, meu bem. Supere as perdas, querida. Vá adiante, coitada. Coitada.

Estou ainda nas dobras do seu vestido de sexta, declamando meus horrores para ver se você se enoja do meu nojo.
Me escute. Evite a esquina dos bares, a calçada de pedras, a flor seca dentro do livro, meus bilhetes de meias-verdades. Me evite.
Não sou bom, tenho chorado demais o futuro que arde em chegar, tenho traído meus focos. Ando descuidado, quebrando bens de valor, sufocando saudades, virando copos demais, ando terrível.

O mundo se transforma na tempestade ingrata de viver e eu já não sei se é por aqui que quero ficar.
Faça suas malas, e vá-se embora de mim.