sábado, 29 de dezembro de 2007

de, para.

Senegal, setembro de 2007

querido amigo,

viver é de fato como o sol poente, belo e fugaz. Aqui, sentir saudades das pessoas que amo, como você, a mim tornou-se ordinário como respirar a poeira eterna deste chão. Vivo colhendo migalhas do afeto que me dirigem, e sinto-me como nunca areia que desliza na ampulheta, em busca do fim.
Quando abri meus olhos e vim para este mundo de seres tão esquecidos, sedentos por olhares e inconcientes da Sodoma que os envolve, jamais pensei ver o que vi. Pois nem mesmo agora que minhas mãos, então sujas, tocam o papel para falar-te, posso crer que tantos vivem de costas pra esse cenário, negando suas fatias de culpa, e construindo suas riquezas sobre estas ruínas, aumentando as muralhas de concreto entre o meu mundo e o seu.
Querido meu, não só as suas saudades, mas também as daquela que amo, e sabes quem, me esmagam o espírito e alargam o abismo entre nós.
Hoje, meus sonhos de outrora são memórias velhas, pois meu eu cansado, agora sonha em poder sonhar. Fazer planos aqui, são meras manisfestações de egoísmo frente a um povo que está para cada sol nascente como o último de suas vidas.
Os sorrisos, não-raros, são sinceros, assim como cada gesto inocente ou cruel. A maldade de uns se aproxima do inferno, a despeito do bem que se opõe com igual teor.
Os povos desta terra não sabem do que passam, porém seus corações sentem afinadamente as perdas que sofrem, que são constantes, mas não banais. Daí explica-se o valor do sol.
Quanto a isso, amigo, queria também falar-te, "de se entregar o viver". Como fazíamos há tempos na nossa juventude eterna.
Fica dito também que o amo indefinidamente, como o disse inúmeras vezes, e me orgulho por tê-lo dito. Pois não sei ser este o último grão de areia que cai para mim, como para tantos que hão de deitar nas sombras desta terra para sempre, antes do nascer de um novo dia.


distante,
Luiz