terça-feira, 23 de setembro de 2008

Fotografia

A briga contra o transitório, renegando o adeus, ferida aberta do ontem.
Memória sólida e pálida, passo que se distancia latente e líquido.
Fatia de vida roubada das horas. Em minhas mãos, já frias.
Não me canso de cansar meus olhos sozinhos sobre nossos velhos adornos.

Não me lembro mais. É distante, irreal, traiçoeiro. Não me lembro. Não fiz.
Enquanto enxergo seus olhares tristonhos de ontem, esmagados e estáticos, mirando o infinito, a mágica do tempo reconstrói suas lágrimas em gozo, em algum outro lugar do universo de nós.

Eu sei. O presente seduz pela imortalidade do que já foi, mas o coração não resiste às tantas perdas e a sonhos brandos demais.
O futuro chegou, mármore frio, mas não chegamos inteiros a ele. Pena.

O que fizemos são fotos, e o pôr-do-sol de hoje é preto-e-branco.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Cálice

Sonhos profundos molhavam sua mente, como raro sentia, e os raios de sol vieram trazê-lo ao novo dia. Era domingo.

O quarto em pedaços, que eram dele e não eram, rejeitava a beleza da aurora que surgia esplêndida lá fora.
Há tempos não conseguia mais despertar e seguir deitado na cama, como havia feito muito e bem. Se lembra que acordava sem medo do correr das horas e sem abrir os olhos permanecia vivendo seus sonhos, considerando hipóteses, deflagrando corações. Costumava sorrir.
Hoje, acordava vestido com a melancolia de sempre, que não era dele, mas ele próprio. Vestia os chinelos, paralelos sob a cama, e ainda envolto em seus cobertores brancos caminhava insone pelo corredor.
Ignorava o espelho.
Os cabelos desarrumados lhe faziam bem, a barba não fazia. Era domingo.

Tentou enxergar sentido em sua coleção de ausências, na ignorância das cartas que não sentia mais, nas lembranças sem cor. As cores ficaram com ela. Ficaram com ele as dores.
Hoje, enquanto ele mastiga o silêncio, ela sorri com vinho tinto e amigos nobres.

Era domingo. Dormia.
Os dias viriam pra encobrir as feridas, como manda o tempo, mas seus sorrisos inférteis seriam o rosto da falta.

Velhos estigmas não o abandonam. Insistem ecoando vadios por-entre as horas, mas não podem ser sentidos em apertos de mão.


É segunda.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Raízes

"As formas das nuvens formam esqueletos guerreiros de espadas na mão.
O sol agora vira bolha e não deixa meus demônios dormirem, a luta que se trava estala gravetos e mergulha em meus porões. Uma guerra, um farol, minha alma."

Minhas casas, ao longe, e a solenidade de minhas idas e vindas me fazem e refazem em versos de mim.
É nesse leve balanço dos tremores de estrada, em busca do amanhã, que saboreio as saudades de um futuro meu, se abrindo em leque.

Apesar de tudo, estou no centro de um destino de fábulas.
Apesar de tudo, sou mar.

As ondas quebram em cor, enquanto outras vêm pra recompor seus hiatos.



na mesa das noites, thaís (em aspas) e eu.